O jornal Folha de Pernambuco nos procurou para participarmos de uma matéria especial sobre a economia colaborativa. Nossas experiências de viagens pelo mundo utilizando recursos colaborativos foram o foco de interesse.

Aqui segue nossa entrevista completa que nos fez a jornalista Mariama antes da publicação:

1 – Como a economia colaborativa entrou na vida de vocês?

Pela porta da curiosidade. Sempre fomos apaixonados pelo mundo. E sempre tivemos um apetite voraz pelas histórias das pessoas e curiosidade por experimentar a vida em outros lugares. Antes de nos conhecermos, cada um de nós havia estado em vários países, por motivo de viagem ou lazer. Cristina como professora de universidades espanholas e depois como consultora de Fundação madrilena que trabalhava em projetos multilaterais com a América Latina. Fernando como bolsista do governo americano e depois coordenando projeto do Banco Mundial. Desde quando nos encontramos, em 2006, em San Jose, na Costa Rica, sempre estivemos buscando alternativas para viajarmos e nos encontrarmos em diversas partes do mundo, uma vez que morávamos em países diferentes: Cristina é espanhola e Fernando, brasileiro. Na época vivíamos em Madrid e Brasília respectivamente. Sem a internet e todas as ferramentas e ambientes que foram criados desde então, não teria sido possível aprofundarmos nosso relacionamento e chegar até onde chegamos. Em 2010, decidimos nos casar. De lá para cá, por necessidade e por curiosidade, seguimos viajando cada vez mais. Começamos pouco a pouco, testando novidades como o AirBnb, em 2012.  No ano seguinte, tomamos a decisão séria de empreender uma Volta ao mundo. Começamos a ler e pesquisar experiências semelhantes. Afinal, percebemos que cada pessoa tem seu modelo de vida e seus interesses e necessidades.

Em outubro de 2014 decidimos que era o momento adequado para iniciarmos nossa viagem pelo mundo. Nascia assim nosso projeto Arte de Partir: uma viagem pelo mundo descobrindo as possibilidades que a economia colaborativa podia nos oferecer. Escrevemos nosso Manifesto. Fizemos um planejamento que se adequasse à nossa realidade econômica, nossa vontade de novas experiências e ao nosso estilo de vida. Flexibilidade, ausência de preconceitos e interesse em conhecer pessoas e provar novas formas de viver são essenciais nesta forma de pesquisar a realidade ao nosso redor.

2- A partir dessa ideia de dar a volta ao mundo, que tipo de experiências/trabalhos/produtos vocês têm compartilhado? 

Toda viagem, especialmente as viagens de descoberta, envolvem basicamente logística e relacionamentos. A logística tem que ver com formas de transporte, hospedagem e alimentação.

Temos experimentado nestas três áreas. De quebra, temos conhecido pessoas fantásticas e feito amigos em vários países. Para hospedagem, já experimentamos troca de casas de forma assíncrona. Você cede sua casa e hospeda-se na casa de outra pessoa em outra cidade do mundo.

My Twin Place” é uma das plataformas que facilita esta opção de hospedagem e que já utilizamos. A partir do quarto mês da viagem, ampliamos a busca por alternativas que permitissem maior aprofundamento na cultura dos lugares e das pessoas com as quais convivemos. Encontramos e passamos usar o “Couchsurfing”. Primeiro na Itália, em seguida na Croácia, Espanha e agora nos Estados Unidos. Consiste em uma grande rede de pessoas dispostas a ceder espaço em casa, em troca de conhecimento, informação e amizade. Na Europa e Estados Unidos utilizamos bicicletas compartilhadas. Na França, na Espanha e nos Estados Unidos, pesquisamos, e utilizamos a alternativa “Workaway”. Foi mais uma fantástica experiência de imersão na cultura local de cada um desses países e uma possibilidade de trabalhar, repassando nossos conhecimentos ou voluntariando em troca de hospedagem e alimentação. Para deslocamentos terrestres na Europa, utilizamos muito o “BlaBlaCar”, uma plataforma de compartilhamento de uso de carros, permitindo reduzir em mais de 60% o valor do transporte, além de criar excelentes oportunidades de conhecer pessoas e histórias maravilhosas. No interior da França, compartilhamos carro com árabes, alemães e mexicanos, transformando uma simples viagem, numa jornada inovadora de conhecimento. Tudo isso, com um “budget” inferior ao que tínhamos originalmente em nosso dia a dia em Recife.

Todos os sites web e os elementos para acessar estas redes de serviços podem ser encontrados em nosso blogwww.artedepartir.com que quando o tempo e o trabalho permitem, tentamos atualizar. Os interessados podem nos acompanhar em nossa página no Facebook:  http://www.facebook.com/artedepartir

3 – Essas trocas terminam financiando a viagem? Como vocês conseguem recursos?

De início, fizemos um orçamento básico, economizamos para termos autonomia de viajar por um ano, dentro da lógica de que nossos custos seriam aproximadamente iguais àqueles que tínhamos em nossa cidade. Na medida em que a viagem avançava, fomos descobrindo que as alternativas disponibilizadas pela “sharing economy”, nos permitiam poupar para podermos com isso dar maior amplitude à viagem. As trocas de hospedagem, incluindo aí a cortesia e os amigos pelo mundo, juntamente com o trabalho naquilo que somos capazes de oferecer, tem nos permitido seguir adiante, sem até agora termos que apelar para patrocínios institucionais. Evidentemente, esta possibilidade está aberta. Como temos registrado a viagem sob várias ópticas e perspectivas, acabamos por acumular know-how que pode ser repassado para pessoas ou empresas. Em Valência na Espanha, fomos convidados por uma incubadora de empreendimentos sociais e por várias outras iniciativas, a apresentar algumas conclusões de nossa experiência de viagem com a economia colaborativa.

4- Quando começou a jornada, onde vocês estão agora, quantos países já conheceram e quais os próximos passos?

Nossa jornada começou em dezembro do ano passado (2014). Desde que saímos do Brasil, passamos por: Espanha, Alemanha, Portugal, França, Itália, Croácia, Bósnia e oeste dos Estados Unidos. Até o final do ano, estaremos cobrindo a costa leste dos Estados Unidos, e chegando até Las Palmas de Gran Canarias. Nós somos adeptos ao Slow Travel:não só passar pelos lugares rapidamente, mas sim conhecer a vida local, fazer amigos e entender como as pessoas se comportam no dia a dia. Por isso, nossa pratica é passar várias semanas em cada lugar. Em dezembro, nosso objetivo é fazer um grande balanço e avaliação e em seguida dar o “salto para a Ásia”. Pensar “fora da caixa” e estar disposto a reajustar a viagem a cada momento são requisitos essenciais que tornam possível realizar este modo nômade de viver.

5- Qual a análise que você faz da economia colaborativa? Pela sua experiência, esse é um conceito que tende a ganhar força?

A vida humana é fruto da colaboração. Com o passar do tempo e as pressões do dia a dia, perdemos a capacidade de perceber isso. O pão que comemos, a roupa que vestimos, a caneta e o papel que usamos para escrever, são fruto da colaboração de milhares de seres humanos. Não se trata de filosofia, mas sim de pura realidade. A chamada “economia colaborativa” poderia ser chamada “filosofia do compartilhamento” ou “antropologia do uso comum” ou ainda “sociologia da otimização dos recursos”. Não importa o título ou rótulo que escolhamos. Cada segmento social tenta batizar e explicar os fenômenos à luz de suas ferramentas ou possibilidades. Neste caso, diria que, a vontade de ajudar, colaborar, tornar possível a realização de sonhos, é intrínseca dos seres humanos. Independentemente de cor, credo, idioma ou condição social. Este é um conceito vitorioso. Nascemos como fruto da colaboração e seguiremos assim por toda a existência.

Cristina e Fernando

Seattle, Estados Unidos. (47° 37′ 35″ N 122° 19′ 59″ O)

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